quarta-feira, 1 de agosto de 2012

Mensalão tucano desaparece da mídia

Por Helena Sthephanowitz, na Rede Brasil Atual:

Causa estranheza o silêncio nas redações da velha imprensa sobre a publicação na revista CartaCapital desta semana dos documentos que mostram o caixa 2 da campanha de reeleição do tucano Eduardo Azeredo ao governo de Minas Gerais em 1998. O pouco que foi publicado a respeito foi Marcos Valério negando a autoria do documento (curioso é que quando o mensalão é tucano, a simples negativa de Valério é aceita sem maiores apurações jornalísticas).

Também apareceram declarações do ministro do STF Gilmar Mendes, negando ter recebido R$ 185 mil constantes na listagem, inclusive dizendo que na época não estava na Advocacia Geral da União (AGU), como sugere a matéria, e sim servindo na Casa Civil do governo Fernando Henrique Cardoso.

Anexo à listagem, tem cópias de depósitos e transferências bancárias que confirmam alguns nomes e valores da lista. Não há destes comprovantes para valores mais altos, que correspondem à maioria de políticos e autoridades famosas, como Aécio Neves, FHC e o próprio Gilmar Mendes (o que tem lógica, para não serem captados pelos alertas do Conselho de Controle de Atividades Financeiras – Coaf, nem deixar rastros).

O fato é que não dá para a velha imprensa esconder essa denúncia do noticiário político. Se for verdadeira é grave e se for falsa também, pois é do interesse do próprio Gilmar Mendes esclarecer quem estaria envolvendo seu nome no mensalão tucano.

Afinal a quem interessaria incluir o nome de Mendes nesta listagem? Ele não é candidato a cargos políticos para ser abatido por escândalos. E se o material for parte de um dossiê político falso, forjado por adversários inescrupulosos, não interessaria colocar um ministro do STF na confusão, porque dividiria as atenções com o alvo, sob risco de enfraquecer e desviar o foco dos políticos do PSDB.

Assim, o mais lógico é que, ou o conteúdo da listagem é verdadeiro na íntegra, ou é parcialmente verdadeiro, e quem estava nela é que se interessou em incluir nomes do Judiciário para causar confusão e anular provas de processos.

É assunto para Polícia Federal esclarecer, mas também para imprensa informar. A CartaCapital publicou na internet a íntegra dos documentos que teve acesso, mostrando-se sintonizada com o jornalismo deste século. A imprensa alternativa, blogs e redes sociais também estão tratando do assunto com a dimensão que merece. O vexame da tentativa de abafar a notícia fica por conta da velha imprensa corporativa.

Síria e as pretensões do imperialismo


Editorial do sítio Vermelho:

Ao iniciar seu giro pelo Oriente Médio (Tunísia, Egito, Jordânia e Israel), nesta segunda-feira (30), o secretário de Defesa dos Estados Unidos, Leon Panetta, indicou – como se fosse necessário – o caráter de sua visita ao brandir ameaças contra o governo da Síria.

A luta para derrotar as milícias que ameaçam Alepo (cidade que é o centro financeiro da Síria) será “um prego no caixão [do presidente Bashar al-] Assad” que, na opinião daquele alto dirigente do imperialismo dos EUA, “perdeu toda a legitimidade”. Ele afirmou também que o regime sírio “está chegando ao fim”.

A arrogância do dirigente estadunidense esbarra no senso comum mais trivial: há legitimidade quando um governo usa a força para manter a integridade de seu território e a segurança de sua população, dentro de suas fronteiras. Sobretudo quando ela é ameaçada por milícias – como ocorre na Síria – fortemente armadas e financiadas por países estrangeiros, e constituídas também por mercenários contratados no exterior.

Um levante armado dentro de uma nação caracteriza uma guerra civil e cabe aos beligerantes procurar, autonomamente, as maneiras mais adequadas para vencer. Não é o que ocorre na Síria. Embora o governo seja laico e existam fortes dissensões entre facções religiosas de sua população, o conflito na Síria vai muito além disso. O que alimenta os confrontos é a articulação entre os chamados “rebeldes” – na verdade milícias mercenárias –, o imperialismo dos EUA e da União Europeia, e grupos fundamentalistas religiosos, como a Al-Qaeda, que se constituíram numa frente armada contra o governo sírio. Seu objetivo não é o programa falso difundido pelo imperialismo através da mídia hegemônica, que alega “razões humanitárias” e defesa dos direitos humanos.

O programa oculto por trás desta alegação hipócrita é a derrota de um governo que é uma pedra no sapato do imperialismo, e de Israel, no Oriente Médio, cujos dirigentes vislumbraram, na chamada “primavera árabe”, a chance de dar uma aparência “democratizante” à derrota do regime de Assad.

Defrontou-se, entretanto, com uma realidade adversa para seus planos. Não pode repetir, na Síria, a mesma escalada agressiva cometida contra a Líbia em 2011 – o povo sírio não se comoveu com o canto de sereia do imperialismo, o poder militar da Síria é superior ao da Líbia no momento em que foi atacada, e encontrou uma resistência internacional mais decidida contra a ofensiva imperialista. As decisões do imperialismo não contam mais, nos organismos da ONU, com apoio semelhante ao obtido em 2011 contra a Líbia. Capitaneada por Rússia e China, a resistência contra as pretensões do imperialismo se acentuou e tem impedido a legitimação da agressão contra a Síria.

A batalha que se trava em Alepo, desde a semana passada, pode ser crucial. Ela tem revelado a disposição do governo sírio de resistir e demonstrado sua capacidade militar e organizativa para isso. Por outro lado, é nítida a desorganização das milícias mercenárias, além de exibir a compreensão que aquelas forças têm do que seja “democracia” e direitos humanos: multiplicam-se as notícias da aplicação de critérios religiosos em “julgamentos” de combatentes aprisionados, que são executados sumariamente, sem direito de defesa e à margem de qualquer legitimidade legal. Linchamento puro e simples, com base na Sharia, inaceitável num Estado laico e dotado de uma tradição de respeito ao Estado de Direito.

O próprio chefe dos observadores da ONU na Síria, o general Babacar Gaye, foi obrigado a indicar esta situação quando, ao manifestar sua preocupação com a continuidade da violência, disse: temos “que reconhecer que esta violência vem de ambas as partes".

Isto é, trata-se de uma luta aberta, provocada por milícias armadas pelo imperialismo e por monarquias árabes tradicionalistas e aliadas ao imperialismo. Autoridades estrangeiras que, hipocritamente, reclamam – como fez o secretário de Defesa dos EUA – quando o governo sírio defende sua população e seu território dos ataques promovidos por forças estrangeiras. A luta em Aleppo é decisiva: a vitória do imperialismo e seus aliados pavimentaria o caminho para mais agressões; sua derrota indicará o fortalecimento da soberania e da autodeterminação das nações.

Os sírios têm seus problemas internos, que nunca foram simples. É preciso reconhecer, com ênfase, que são contradições cuja resolução cabe apenas a eles como povo soberano. E a vitória contra a agressão estrangeira patrocinada pelos EUA pode simbolizar um passo importante na luta contra a agressividade imperialista e pela paz mundial.

Editorial de Carta Maior

A adesão da Venezuela como membro pleno do Mercosul consolida no coração da América Latina uma referência de recorte progressista como talvez nunca tenha existido na região, com a abrangência institucional e o fôlego econômico intrínseco ao bloco agora liderado por Dilma Rousseff, Cristina Kirchner, Pepe Mujica e Chávez.

Cuba certamente exerceu um magnetismo ideológico superior ao desse quarteto nos anos 60, mas esse ardor não se traduziu em uma organização duradoura com o alcance potencial que o Mercosul desfruta e deve ampliar, graças à incorporação do detentor da maior reserva de petróleo cru do mundo (a Venezuela tem 296,5 bilhões de barris, seguida da Arábia Saudita,com 264,5 bilhões de barris).

Trata-se de mais um enfrentamento no qual os interesses conservadores, muito bem refletidos no bombardeio midiático contrário a essa inclusão, foram habilidosamente derrotados . Não é um revés em torno de uma questiúncula pontual. Os que hoje, como há uma década, sopram o interdito à presença venezuelana, são os mesmos que, paralelamente, defenderam à exaustão a ALCA, como alternativa a uma inserção global do continente assumidamente subordinada e dependente do gigantesco mercado norte-americano. Foram derrotados.

Há pouco, no golpe contra Lugo, encrespado com a suspensão dos golpistas no âmbito do Mercosul, o jornal 'Estadão' destilou a nostalgia da velha agenda. Em editorial efervescente aconselhou a direita paraguaia a responder à punição jogando-se nos braços dos EUA, de modo a consumar, pelo menos, mais uma mini-Alca regional, expressão cunhada pelo embaixador Samuel Pinheiro Guimarães, em coluna recente em Carta Maior.

A opção de desenvolvimento regional integrado e soberano , reafirmada pela Cúpula de Brasília do Mercosul, insere-se assim numa espiral de enfrentamentos em que o guarda-chuva maior do conservadorismo verga sob o peso da dissolução da ordem neoliberal. É nesse esquina de derrotas históricas apreciáveis que a seção brasileira perfila armas e concentra tropas para fazer do julgamento do chamado mensalão uma espécie de 3º turno simbólico de sua anemia política.

O julgamento que começa nesta 5ª feira oferece-se como um raro campo em que a relação de forças aparenta ser-lhes favorável. Mídia e judiciário conjugam-se como donos de um espetáculo em que 38 réus, entre eles algumas das maiores lideranças do PT, 50 mil páginas processuais e 600 testemunhas ouvidas serão esmiuçadas e reiteradas em 15 sessões, somando-se um total de 90 horas de julgamento, a ocupar os holofotes noticiosos ao longo de todo o mês de agosto e 1ª quinzena de setembro.

Não se subestime o poder de fogo dessa parafernália. Mas não se perca o pano de fundo sobre a qual ela se dá. O conservadorismo aferra-se à batalha do dia anterior na esperança de apagar do imaginário social a percepção de que seus interesses e credo são parte de um mundo que ruiu. A ver.

A segurança pública tucana

A política de segurança pública de São Paulo está falida. Uma política que se resume em aumentar o número de presídios e o número de policiais militares
Editorial da edição 492 do Brasil de Fato
Diante da repercussão do assassinato do empresário Ricardo Prudente de Aquino, pela PM paulista, o governador tucano exigiu uma apuração rigorosíssima e prometeu acelerar a indenização do Estado à família do morto.
Sendo condescendente com o governador, é impossível não enxergar em suas palavras um primado de cinismo. Passa a impressão de que a desastrada ação policial, que custou mais uma vida humana, é um caso isolado e deveu-se apenas aos erros de procedimento dos envolvidos na operação militar, os que dispararam as balas assassinas.
Somente um olhar obtuso, ou mal-intencionado, pode ignorar que esse caso é apenas mais um de centenas de outros. É possível desassociar a desastrada ação policial, que lamentavelmente custou a vida de Aquino, das chacinas e execuções sumárias que se espalham pela periferia da cidade? Ou ignorar que a morte de 26 PMs, em dias de folga dos trabalhos, ocorridas de janeiro a maio, elevam o stress dos policiais e seus familiares a níveis insuportáveis? Atirar primeiro e perguntar depois - se sobreviver alguém a quem perguntar - virou a prática cotidiana das forças públicas encarregadas da segurança da população. Esse script só é questionado quando a vítima não é pobre, ocupa espaço na mídia e sensibiliza o governador.
O emprego da força e a letalidade policial em São Paulo são assustadores. No estado de São Paulo, de janeiro a maio, 1 de cada 5 homicídios foi cometido pela PM. Nos Estados Unidos esse índice é de 1 para cada 35 homicídios. De 2006 a 2010, 2.262 pessoas foram mortas pela PM paulista. No mesmo período, em todo o território estadunidense, a polícia matou 1.963 pessoas. São Paulo tem 41 milhões de habitantes, o que lhe confere uma taxa de 5,5 mortes para cada 100 mil habitantes. EUA tem 313 milhões de habitantes e a taxa cai para 0,63.
E há, junto à classe média, setores do comando da PM e do governo, quem defende o uso de mais repressão policial como única saída para combater a violência e a criminalidade existente. São incapazes de perceber que a política de segurança pública de São Paulo está falida. Uma política que se resume em aumentar o número de presídios e o número de policiais militares. Evidencia sua falência aos mostrar-se incapaz de combater o crime organizado, quem comanda suas atividades criminosas de dentro dos presídios, tem atuação permanente nas periferias – incluindo regiões centrais da capital – e apresenta-se à sociedade como um verdadeiro poder paralelo ao do Estado.
Falência evidenciada, também, no tratamento dado as questões sociais. A polícia do governo tucano não sabe enfrentar uma simples passeata de estudantes em defesa do passe escolar, ou uma manifestação de grevistas, sem usar cassetetes, bombas de gás, cães e balas de borracha. A síntese dessa truculência e desumanidade contra a população pobre se materializou na ação policial contra os usuários de crack, na região central da capital, e no despejo das famílias do bairro do Pinheirinho, em São José dos Campos (SP). Não é por outra razão que os governos tucanos, tanto do José Serra quanto o do Geraldo Alckmin, sofreram denúncias na Comissão de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA).
Ou seja, essa violência policial é coerente com a direitização do PSDB. A jornalista Maria Inês Nassif já havia alertado, em janeiro/ 12: “O governador é conservador; o PSDB tornou-se organicamente conservador, depois de oito anos de governo FHC e oito anos de posição neoudenista. A polícia é truculenta (...) e foi mais do que estimulada nos últimos governos a manter a lei, a ordem e esconder a miséria debaixo do tapete.” Assim, o comandante-geral interino da PM, coronel Hudson Camilli, está sendo coerente com a linha política dos últimos governos tucanos quando afirma que o número de mortos em confronto com a PM está dentro da normalidade. Como foi coerente o governador José Serra ao escolher o Reitor da Universidade de São Paulo (USP) que abriu o campus para a PM.
A dissertação de mestrado do tenente-coronel Adilson Paes de Souza, defendida na Faculdade de Direito da USP, sobre a Educação em Direitos Humanos na Policia Militar, traz elementos reflexivos para a reestruturação da força policial encarregada da segurança da população. Para o tenente-coronel, hoje na reserva, a educação de baixa qualidade em direitos humanos é uma das causas da violência policial.
Mas é necessário, também, promover mudanças mais amplas e profundas na economia e nas políticas públicas, que extrapolam o âmbito do estado de São Paulo. Políticas de combate à pobreza e a desigualdade social, que promovam a democratização da riqueza e da renda produzida na 6ª economia mundial, com índices sociais vergonhosos.